O meu 2022

Pela primeira vez em muito tempo, não publiquei meu tradicional texto de balanço do ano que se encerrava em seu último dia. O principal motivo foi não ter começado a escrevê-lo antes: pretendia fazê-lo na noite de 29 de dezembro, mas o falecimento do Rei Pelé tomou toda a minha atenção; meu pai faz aniversário no último dia do ano e assim a noite anterior foi de churrasco pensando no abraço à meia-noite. E no 31 de dezembro de 2022 simplesmente não parei.

No fim, foi até melhor. Veio o 1º de janeiro de 2023, e enfim a posse de Lula para pôr fim ao pesadelo que foi o (por assim dizer) governo Bolsonaro. O pior presidente que o Brasil já teve fugiu sem se dignar a passar a faixa a seu sucessor; mas de certa forma acabou sendo melhor assim, pois a entrega por parte de representantes do povo brasileiro a Lula foi linda e simbólica do que representa este terceiro mandato dele. Será um imenso desafio reconstruir um país que vinha sendo saqueado desde 2016 (pois tudo isso começou com o golpe contra Dilma naquele ano), e procuro não me iludir com as lembranças da bonança que vivemos nos dois primeiros mandatos de Lula.

O primeiro dia de 2023 foi, de certa forma, o ato final de 2013, visto que o inferno pelo qual passamos começou com a captura das manifestações daquele ano pela direita.


A eleição presidencial foi, sem dúvida alguma, o momento definidor de 2022. Caso Bolsonaro tivesse sido reeleito, provavelmente eu estaria falando de um ano “trágico”, tal qual foi 2018 (que no aspecto pessoal esteve longe de ser ruim, ainda que também de ser dos melhores). Como a maioria do povo (ainda que por estreita margem) optou por Lula, podemos respirar aliviados: o país se livrou de mergulhar numa ditadura que poderia fazer 1964 parecer “brincadeira de criança”.

2022 foi o ano no qual conheci a covid-19 “de perto” – digo, com o vírus no meu corpo. DUAS VEZES: uma em fevereiro e outra em novembro. Felizmente, ambos os casos foram leves e, que eu saiba, não transmiti para ninguém. E pensar que tem gente por aí dizendo que vacina não funciona… Estar imunizado com a terceira dose (em fevereiro) e com a quarta (novembro) certamente fez toda a diferença – ainda mais que felizmente não tenho comorbidades. Em compensação, no final de junho tive um resfriado (doença para a qual infelizmente não existe vacina) que me deu muito mais congestão nasal que as duas vezes que peguei covid SOMADAS.

As vacinas ajudarem a preservar minha saúde é uma das razões pelas quais nada tenho a reclamar de 2022. No aspecto pessoal, aliás, foi um belo ano. Viajei pela primeira vez desde 2019 (em 2020 e 2021 não o fiz por conta da pandemia de covid-19) e também pela segunda: em janeiro fui à Praia do Cassino por poucos dias; em março fui a Curitiba e Florianópolis, retornando a Porto Alegre no começo de abril. Voltei à Arena do Grêmio após afastamento de quase dois anos imposto pela pandemia (poderia ter retornado ainda em 2021 mas esperei até 2022). Já que falei de futebol, o Grêmio voltou aos trancos e barrancos para a Série A mas no último dia do ano anunciou Luis Suárez (ou seja, entra MORDENDO em 2023). Teve Copa do Mundo para fechar o ano “com chave de ouro”, com Messi jogando tudo o que sabe e mais um pouco para ajudar a Argentina a conquistar a taça pela terceira vez, trazendo-a de volta a América do Sul após 20 anos.

O ano de 2022 foi também de aprendizados em termos profissionais, muito por minha opção de mudar de setor no trabalho. Falo tão mal daquela galera “coach” que fala em “sair da zona de conforto”, mas ironicamente fiz isso – no caso, pedi para sair da unidade onde trabalhava desde 2016 – e não me arrependo nem um pouco.

Não acho que 2022 tenha sido o melhor ano da minha vida. Mas foi o melhor desde, pelo menos, 2015, ano que quando acabou considerei como ruim mas hoje em dia percebo como fundamental para o que sou hoje, pessoal e profissionalmente. Até entendo que muita gente tenha achado ruim, pesado, por conta da política, mas se pensarmos no resultado final, dá para dizer que valeu a pena. E para mim, valeu demais.

A um mundo que acabou

Melhor meme de 2012

21 de dezembro de 2012, 22h

É uma noite de sexta-feira, mas estou em casa defronte ao computador, me divertindo com memes sobre mais um “fim do mundo”. Obviamente é mais um momento de dar risada, visto que passei por vários “fins do mundo” e continuo aqui.

A “culpa” é dos Maias, cujo calendário se encerra hoje. Soube disso no segundo semestre de 2005, quando cursei a disciplina de História da América Pré-colombiana na faculdade, e na hora imaginei que sete anos depois estaríamos nos divertindo com mais um “fim do mundo”, ainda que o término do calendário maia signifique na visão deles o fim de um ciclo e não de tudo.

Dá para pensar: qual ciclo estará se encerrando? O que virá depois será melhor ou pior? Não tenho como saber…

Para além do Facebook, é bom dar uma olhada na caixa de e-mails, volta e meia chega alguma coisa importante ali. E é estranho o que vejo na caixa de entrada: um e-mail cujo remetente sou eu mesmo. Essa porcaria não deveria ter caído na caixa de “spam”?

O título do e-mail é estranho: “2012–2022”. E então percebo o mais bizarro: ele tem como data o dia 21 de dezembro de 2022, ou seja, é como se tivesse vindo “do futuro”.

Vou abrir, mas com cuidando para não clicar em qualquer link estranho.


2012–2022

Como certamente já percebeste, eu/tu mesmo sou/és remetente e destinatário deste e-mail. Sim, é engraçado.

Mas não estamos no mesmo tempo, como pode ser percebido pela corretíssima data no cabeçalho: escrevo e envio esta mensagem na noite de 21 de dezembro de 2022, uma quarta-feira, três dias após a final da Copa do Mundo do Catar — sim, ao contrário do que imaginavas que ia acontecer, a FIFA não mudou a sede da Copa, e sim o período dela, do meio para o final do ano. E, acredita, isso será legal demais. Ainda mais após tudo o que passamos nos tempos recentes — que para ti ainda são “futuro”, e não iniciarão exatamente após o “fim do mundo” que por aí está divertidíssimo, mas não tardarão muito.

Não tenho como contar exatamente o que irá acontecer, pois isso poderia fazer (caso alguém acreditasse no que escrevo, obviamente) com que tudo mudasse e aí sim o espaço-tempo poderia entrar em colapso. Mas posso dar links do que virá, espero que funcionem mesmo antes de serem publicados.

Uma coisa óbvia é que o mundo não acaba aí — tá mais arriscado alguém morrer de rir dos memes do que sendo atingido por um dos “aerolitos” que soterram o Chapolin. Ainda que de vez em quando alguns possam cair na Terra e até causarem estrago, especialmente na Rússia (não por nenhuma preferência por vodca, mas sim por ser apenas o maior país em área territorial).

E se o fim do mundo não for causado por um “aerolito”? É bem mais plausível que o fim não seja “cataclísmico” como retrata (ou “sonha?”) a indústria dos “filmes-catástrofe”, mas sim que aconteça aos poucos, num longo e penoso processo histórico cujo início só seja definido quando temos suficiente distanciamento temporal dele.

O mundo não acaba aí e nem é o 21 de dezembro de 2012 o marco inicial do processo histórico que vivemos em 2022 — trata-se apenas de uma efeméride que recordo pela passagem de uma década. Alguns sinais do que vem pela frente já estão por aí faz vários anos, outros chegarão em pouco tempo, até que as coisas definitivamente sejam tiradas do lugar.

Vários sinais estão na política — de cuja “previsibilidade” daí de 2012 eu sinto muita falta aqui na década que se passou. Aliás, o principal deles me faz lembrar da famosa frase “a bola pune” dita pelo Muricy Ramalho para fazer uma analogia com o que virá. Aprendemos da pior forma possível que tem consequências deixar impune um deputado que merece cassação. Tal qual a bola, o voto pune. Acho que não preciso dizer o nome — tem vários posts no meu/teu blog falando das barbaridades de tal criatura.

Sim, imagino o pensamento aí em 2012: Bolsonaro vai virar presidente? Como isso pode ser possível?

Até acho que dá para tentar evitar sem causar o colapso do espaço-tempo, pelo menos em termos de Brasil. Impossível que as coisas sejam piores caso outro candidato vença a eleição de 2018. O problema é que o Bolsonaro será apenas mais um de uma tendência mundial — sendo que algumas figuras até já estão no poder lá na Europa, e só serão percebidas mais adiante.

É verdade que o Bolsonaro vai perder a reeleição em 2022 (sim, estou feliz agora quando mando essa mensagem), mas o estrago que ele causará… Vai ser uma tarefa dura reconstruir este país, mas quero acreditar que será possível (até agora não recebi nada vindo de 2032). Não toma cicuta ao terminar de ler este e-mail, por favor.

Aliás, vale lembrar que cicuta não cura nenhuma doença, mesmo que comecem a espalhar por aí que sim. Esse será outro grande problema mais adiante: uma galera começará a dizer que a Terra é plana (!!!), mas pior ainda será quem fala o absurdo de que vacina faz mal… Vacina!!! Lembra que falei do fim do mundo poder vir aos poucos e não de uma forma cataclísmica? Pois então, olhamos muito para pedras gigantes no espaço quando o fim pode já estar escondido aqui na Terra. (Dica: aproveita muito o ano de 2019.)

Falei muito de fim do mundo e seus sinais: políticos bosta, coisas escondidas na Terra, e deves estar se perguntando sobre o aquecimento global. Afinal, ele parou? Bom, te digo que com o Bolsonaro na presidência só aumentou a preocupação do mundo com a devastação da Amazônia e suas consequências para o clima mundial, o que já dá uma pista. Aliás, adiantando um fato pessoal: em pouco mais de três anos escaparás de um desastre climático pelo simples fato de mudar de cidade (sim, Porto Alegre não é tua/minha casa pela vida inteira).

Comecei esta mensagem citando a Copa de 2022, mas acredito que aí em 2012 a tua curiosidade (e a de todo mundo) é sobre quem ganha no Brasil em 2014. Não vou contar pelo simples fato de que ninguém vai acreditar mesmo.

E encerro falando de política: para um pouco de chamar o Alckmin de “picolé de chuchu”. É sério. Aqui em 2022 eu nunca critiquei ele.


22 de dezembro de 2012, 9h

Que doideira esse sonho que tive. Ora, e-mail do futuro… HAHAHAHAH!

E olha os papos do maluco se passando por mim no futuro. Bolsonaro presidente do Brasil? Que diarreia mental é essa? E que história é essa de Alckmin? Mais uma enquete sobre novo técnico do Inter?

E ainda dizendo que ninguém acreditará no que vai acontecer na Copa de 2014… Seria algo extraordinário, totalmente impossível, tipo o Brasil perder uma semifinal de 7 a 1? É fácil dizer que “veio do futuro” e não falar nada sobre daqui um ano e meio, né?

E ainda enchendo o e-mail de links. Até parece que sou idiota de clicar neles e encher meu computador de vírus, né? Já basta os resfriados que pego ao longo do ano! Ah, se tivesse vacina para eles…

A Copa do alívio

Foi o maior intervalo entre duas Copas do Mundo desde os 12 anos que separaram os torneios de 1938 na França do de 1950 no Brasil. Mas naquela ocasião houve uma tal de Segunda Guerra Mundial no meio do caminho. Agora foi apenas o resultado de uma escolha bizarra que levou a Copa para um país no qual faz 50 graus à sombra em junho e julho.

Desta vez foi até um pouquinho (mas BEM pouquinho mesmo) menor do que se previa: era para a Copa do Mundo de 2022 começar amanhã, dia 21, mas por uma bizarrice na tabela a cerimônia de abertura ocorreria após duas partidas já terem sido jogadas — visto que a “inauguração oficial” teria de ser logo antes da estreia do anfitrião Catar — e houve assim a alteração na ordem dos jogos.

Um dia a menos de espera para um dos Mundiais mais aguardados, pelo menos por mim. Não pelos 1589 dias que separam 15 de julho de 2018 deste domingo, 20 de novembro (o intervalo anterior tinha sido de 1432 dias entre 13 de julho de 2014 e 14 de junho de 2018). Tampouco pelo país escolhido para sediá-la, uma monarquia absolutista em pleno Século XXI e que não tem tradição alguma no futebol: o Catar é o primeiro anfitrião que sedia uma Copa sem jamais ter jogado uma anterior desde a Itália em 1934 (que não quis viajar ao Uruguai para a edição inaugural quatro anos antes), e hoje se tornou o primeiro a ser derrotado na estreia — para efeito de comparação, a África do Sul (que provavelmente perderá o posto de único país-sede eliminado na primeira fase) empatou com o México na abertura da Copa de 2010, e só não foi às oitavas-de-final por ter saldo de gols pior que os mexicanos.

Esta é para mim a Copa do Mundo do alívio.

Afinal de contas, temos Copa, e estou vivo para assisti-la. Dois anos e meio atrás, eu tinha minhas sinceras dúvidas.

Logo no início das quarentenas impostas pela pandemia da covid-19, a FIFA liberou em seu canal no YouTube o seu documentário oficial da Copa do Mundo de 2018. Fazia menos de dois anos que tinha soado o apito final da decisão entre França e Croácia em Moscou, faltava muito tempo para a bola rolar no Catar, mas a sucessão de eventos esportivos sendo adiados ou mesmo cancelados me fazia não ter certeza de que poderia curtir uma Copa em 2022. Assisti ao documentário pensando em quanto tempo eu precisaria suportar só relembrando jogos do passado; mais adiante, quando o futebol voltou sem público, os estádios vazios nos quais dava para se ouvir (pela televisão) tudo o que se gritava dentro de campo só faziam aumentar a saudade não só de estar na Arena do Grêmio, como também de abraçar pessoas e confraternizar.

Fora, é óbvio, o medo de contrair a doença e não sobreviver. (Felizmente só fui pegar em fevereiro de 2022, já tendo tomado três doses de vacina que transformaram a covid-19, no meu corpo, em algo mais suave que qualquer resfriado que já tive.)

A Copa do Mundo, finalmente, começou. Ainda sob pandemia, mas numa situação bem melhor que a de dois anos e meio atrás: hoje temos vacinas e sabemos bem mais sobre o vírus que paralisou o mundo em 2020. Podemos não só ver jogos com público nos estádios como também é possível confraternizar com amigos. Nada parecido com os dias horríveis que vivemos na maior parte de 2020 e 2021.

E, se por um lado a escolha do Catar como sede foi bizarra, por outro lado nos proporcionou essa Copa no final do ano: ela termina dia 18 de dezembro e pouco depois, acabam também 2022 e o mandato do pior presidente que o Brasil já teve.

Que alívio!

Sobre uma urgência: a eleição mais importante de nossas vidas

Neste domingo irei à minha seção eleitoral e, após digitar os números de meus candidatos para quatro cargos, virá o quinto e mais importante de todos, ainda mais em 2022: o de Presidente da República.

Só que não será uma simples escolha de uma pessoa para governar o país pelos próximos anos. Será um voto, dentre diversos motivos:

– Para que o Brasil volte a ser respeitado, e não motivo de chacota, na comunidade internacional;

– Pelo resgate dos símbolos nacionais das mãos de um grupo político que se diz “patriota” mas na verdade odeia o Brasil e o povo brasileiro;

– Pela transparência e pelo fim dos sigilos de 100 anos;

– Pelos servidores públicos, meus colegas, tão atacados nestes últimos tempos;

– Em defesa do SUS, que aplicou centenas de milhões de doses de vacina contra a covid-19 nos nossos braços, e ainda cuidou muito bem da saúde da minha mãe em três ocasiões apenas no ano passado;

– Pela volta do incentivo à vacinação, o que sempre foi um orgulho nacional;

– Para frear a destruição da Amazônia e do Pantanal;

– Pelas minorias que, somadas, são a maioria de nossa população mas ainda assim enormemente perseguidas: mulheres, indígenas, negros, LGBTQIA+;

– Para que o Brasil saia novamente do Mapa da Fome da ONU;

– Contra a inflação que levou inúmeras famílias à pobreza extrema;

– Contra a violência política e o discurso de ódio que levou a assassinatos nesta campanha — com todos os autores de um lado e as vítimas do outro na disputa eleitoral;

– Pelo fim da interferência dos militares na política;

– Contra o discurso da falsa “polarização”, que põe na mesma barca uma candidatura de centro-esquerda que nunca pregou contra a democracia, e outra de extrema-direita que não tem vergonha alguma de louvar torturadores e a ditadura de 1964;

– Contra os discursos golpistas;

– Contra as teorias conspiratórias sobre fraudes eleitorais;

– Contra o negacionismo e a desinformação;

– Pela memória das quase 700 mil pessoas que morreram de covid-19 desde março de 2020 no Brasil, que não eram apenas números: eram avós, avôs, mães, pais, irmãs, irmãos, parentes, cônjuges, amigas e amigos… E em sua esmagadora maioria, não teriam morrido caso a presidência fosse ocupada por alguém à altura do cargo.

Por tudo isso, meu voto é 13.

Não tenho a ilusão de que teremos a mesma bonança de quando Lula governou o Brasil pela primeira vez: o contexto atual é muito diferente daquele de 20 anos atrás. Talvez fosse bom uma renovação.

Mas isso pode muito bem ficar para depois, primeiro temos de resolver o que é urgente. E nada urge mais do que começar a acabar, o mais rápido possível, com esse inferno que vivemos nos últimos quatro anos. Nem falo em “pesadelo” pois de um é possível acordar: o que temos agora é assustadoramente real, e ainda deve demorar um pouco para passar totalmente — e por isso é preciso dar o primeiro passo.

Fora Bolsonaro. Agora.


Um adendo: na lista de motivos nem falei do horário de verão, extinto por Bolsonaro, por julgar que isso se tornou insignificante diante do horror que passamos. Mas vale a lembrança para ressaltar que, quando se fala que é um “governo das trevas”, não é mera figura de linguagem: nem aquele solzinho que permite ficar no parque até mais tarde durante o verão nós temos mais; em compensação, perdemos o sono pois às 5 da manhã já está muito claro.

A respeito de longevidade

Morreu a rainha Elisabeth II do Reino Unido e, junto com ela, os memes sobre uma suposta “imortalidade”. O melhor, sem dúvida, era um que nos perguntava que mundo iríamos deixar para a veterana monarca.

Partiu aos 96 anos, após ser Chefe de Estado por sete décadas. Quando Elisabeth II tornou-se rainha, o presidente do Brasil era Getúlio Vargas, que iniciava o segundo ano de seu mandato conquistado nas urnas em 1950; o atual presidente (se é que dá para chamar assim alguém que puxa um coro de “imbrochável” em pleno bicentenário da Independência) ainda nem havia nascido. Fazia tão somente sete anos que havia acabado a Segunda Guerra Mundial. Ela deu posse a um primeiro-ministro nascido em 1874 (Winston Churchill) e a uma nascida em 1975 (a atual, Liz Truss, nomeada dois dias antes do falecimento da rainha). Apenas quatro Copas do Mundo haviam sido disputadas e o Brasil ainda não tinha conquistado nenhuma; tal glória era restrita a Itália e Uruguai.

Minha avó Luciana tinha 30 anos de idade, meu pai era bebê de colo e minha mãe tinha quatro anos e meio. A rainha, nascida em 1926, era em 2022 mais velha que 99% da população mundial.

Dizer, portanto, que terminou uma era não me parece exagero. Vou além: desde que me conheço por gente ouço falar no noticiário da “rainha da Inglaterra”. Por mais que eu seja contra a monarquia e a glorificação em torno dela, é inegável que de certa forma tornou-se uma “referência”.


Quando Jô Soares faleceu, no último dia 5 de agosto, imediatamente lembrei de uma excelente crônica escrita em 2014 por Eliane Brum. O título já diz tudo: “o mundo da gente morre antes da gente”.

Reparei naquele dia que boa parte das referências simbólicas de minha criação ou estão na casa dos 70, 80 anos, ou morreram sem que isso fosse um choque: é bem diferente Jô Soares nos deixar por uma doença aos 84 do que Ayrton Senna partir aos 34 após bater a 200 km/h numa curva de uma pista insegura. (Aliás, se fosse vivo, Senna teria hoje 62 anos: quantos títulos mais teria conquistado? E prefiro nem ficar nessa de pensar se seria ou não bolsominion.)

Cazuza, falecido em 1990, teria 64 anos se estivesse vivo. Era mais novo, mas não tão mais novo assim, que Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Milton Nascimento… Diferença inferior a 20 anos.

Segundo Paulo Roberto Falcão, o jogador de futebol tem duas mortes: a primeira é quando para de jogar e a segunda quando morre de fato. Então lembro de Ronaldo “estourando” no Cruzeiro em 1993, aos 17 anos: pendurou as chuteiras cedo (com apenas 34), é verdade, mas já se aproxima dos 46. Vários ídolos da década de 1990 já passaram dos 50, e alguns dos jogadores que marcaram a inesquecível Copa do Mundo de 1994 até já faleceram (ainda que esses casos se enquadrem naquele critério “morte chocante”: o nigeriano Rashidi Yekini partiu em 2012, aos 48 anos; já o “lobo búlgaro” Trifon Ivanov sofreu um infarto fulminante aos 50, em 2016). O camaronês Roger Milla já era veterano quando “me conheci por gente”, mas hoje tem 70 anos – apenas alguns meses mais novo que meu pai.


Lembro de quando meu pai ainda não tinha nenhum fio de cabelo branco, em um evento de dia dos pais na escolinha onde eu fazia o Jardim de Infância, respondendo a coleguinhas que perguntaram a idade dele: “tenho 35 anos”. Hoje ele tem o dobro de idade, além de barba e cabelo totalmente brancos. E é minha barba e o (que me resta de) cabelo que está embranquecendo aos 40, quase 41.

Mas o que me chama mais a atenção, ainda mais na comparação com a rainha falecida, é o caso de minha avó paterna Luciana, que morreu em 2020 com 98 anos. E me faz pensar ainda mais no que Eliane Brum escreveu, de que “o mundo da gente morre antes da gente”.

Se pinta muito uma ideia bacana da longevidade, de “ver muitas coisas acontecerem”. Como se todo mundo fosse a rainha: rica e com a chefia de um poderoso Estado em mãos única e exclusivamente por ter herdado tal direito do pai, sem ter feito esforço algum para isso (alô, defensores da meritocracia: expliquem essa, por favor).

A minha avó teve muitos cuidados até o final da vida. No dia em que faleceu, um médico foi atendê-la na casa geriátrica onde viveu seus últimos três anos: como diagnosticou que ela provavelmente estava morrendo, deu uma potente injeção contra a dor para que sofresse o mínimo possível.

Mas isso não saiu “de graça”. Os cuidados necessários para que uma pessoa viva quase 100 anos com o máximo de conforto possível são bastante dispendiosos. Boa parte das famílias não têm condições para que seus velhinhos possam ter equipes de cuidadores (em casa ou numa geriatria). Penso até mesmo no meu caso: não tenho e nem quero ter filhos num mundo que dá pinta de que a vida será insuportável num futuro não tão distante por conta das mudanças climáticas; como também tenho preguiça da “burocracia” para conseguir casar (mesmo sem cerimônia), quando estiver velho provavelmente serei apenas eu por mim e, certamente, sem ganhar o suficiente para bancar as despesas. Alcançar uma idade muito avançada sem precisar de cuidados é bastante improvável, então já acho que é melhor não chegar tão longe.

Só que o principal aspecto que penso é no fim do “mundo da gente”, que acontece antes de morrermos quando chegamos à velhice. Se eu percebo que boa parte de minhas referências simbólicas estão partindo de forma natural, as de minha avó já não existiam muito tempo antes de 2020.

E tem algo pior: as pessoas com que se convive a partir de um momento na vida começam a morrer sem causarem choque por terem pouca idade (visto que tendemos a nos relacionar com pessoas que “regulam” conosco nesse aspecto). Felizmente não perdi nenhum amigo mais próximo mas já se foram antigos colegas que tinham idade semelhante à minha, vítimas de acidente de carro ou doenças graves; em ambos os casos a sensação era de que tinham morrido “antes do tempo”. Meu pai já perdeu amigos com idade próxima à dele sem que isso fizesse pensar que tinham ido “cedo”; cerca de metade dos irmãos de minha mãe já morreram: ainda que ambos tenham saúde (que obviamente não é a mesma de anos atrás), não deixa de ser um “sinal dos tempos”, que passam para todo mundo.

Minha avó, em 2020, não era apenas uma velhinha de quase 100 anos que não conseguia mais caminhar e dependia de ajuda para fazer quase que qualquer coisa. Ela também já tinha perdido todas as amizades. O único irmão vivo (que faleceu em 2021, aos 95 anos) sofria de Alzheimer e tinha perdido praticamente toda a memória; morava com ela na geriatria mas poucos dias após ela morrer já se esqueceu. As demais pessoas vivas e próximas a ela eram muito mais novas, de “outro tempo” que já não era o dela.

Vale a pena? Sinceramente, acho que não.

As redes da previsibilidade

Duvido que exista algo mais previsível do que as redes antissociais. Não à toa, alguns anos atrás chegaram a criar um “calendário de tretas do Facebook” que era INCRIVELMENTE CERTEIRO.

Uma das mais manjadas é a do Dia dos Pais. Para além daquela que também existe no Dia das Mães, sobre validar ou não a “maternidade/paternidade de pet”, também tem toda aquela polêmica sobre os pais serem muito ausentes e ainda assim celebrados.

Não discordo: o fato de meu pai sempre ter sido muito presente ainda que separado de minha mãe desde que eu tinha 5 anos de idade (hoje tenho 40) não torna isso uma regra. Conheço muitas pessoas cuja relação com o pai é de ruim para péssima. (Da mesma forma que também há mães que não fazem muito por merecer homenagens.)

Mas mesmo dentre essas pessoas muitas delas não ficam reclamando de outras celebrarem o Dia dos Pais, inclusive com postagens nas redes antissociais. O problema é que os “reclamões” sempre chamam mais a atenção (e isso que nem são tão poucos realmente). Aí, dê-lhe “problematização” sobre a ausência paterna e o fato de ser uma data comercial. (E qual desses dias comemorativos mais badalados não é?)

Engraçado é que muitos desses “reclamões” não deixam de postar, quando comprometidos, mensagens “fofas” no Dia dos Namorados, que é uma data assumidamente comercial (surgiu para incrementar as vendas em junho), e sem pensar na “ausência sentimental” de pessoas que não gostariam de estar solteiras.

Particularmente, prefiro as homenagens às mães e aos pais que fazem jus a isso (felizmente posso fazê-las sem ser apenas de forma protocolar, ainda que eu prefira comemorar dando abraços e carinho sempre). E no ano que vem, as postagens serão para celebrar as mesmas pessoas. Já as de junho, eu só observo quantas vezes as figurinhas mudam… Acho bem divertido.

Bons tempos em que eu escrevia

Julho, mês que costuma representar o auge do inverno no Rio Grande do Sul, terminou com um friozinho que não representa o que ele realmente foi. Não sei de dados estatísticos quanto a isso, mas provavelmente foi o menos frio desde, pelo menos, 2017.

Se faltou cara de inverno justamente no mês que em outros anos foi o auge dele, também é verdade que o frio esteve mais presente do que eu aqui neste espaço. Tanto que fui escrever estas linhas já perto da meia-noite, quando julho já estava virando agosto.

Julho terminou tendo como destaque a quarta dose da vacina da covid-19, que tomei justamente no aniversário da primeira. Como boa “comemoração”, a dose fabricada na Fiocruz tal qual a que começou minha imunização em 7 de julho de 2021 me deu uma reaçãozinha, mas muito leve na comparação com a do ano passado: apenas um pouco de sonolência e dor no corpo que na manhã seguinte nem senti mais.

Algo que julho também não teve foi derrota do Grêmio, tal qual junho. Aliás, desde o começo de maio não sabemos o que é perder: não jogamos um futebol vistoso mas fazemos pontos, que afinal de contas é o que importa na Série B – penso que o fundamental é sair desse inferno.

Não prometo maior frequência de textos em agosto pois já faz oito anos que fracasso retumbantemente todas as vezes que digo “agora vou retomar a frequência de textos”. Pois infelizmente não vejo possibilidade de uma retomada da blogosfera como se tinha no final dos anos 2000 e no começo dos 2010. Sem leitores frequentes como naquela época, a motivação para escrever cai.

E o app móvel do Medium?

Semanas atrás decidi “reviver” meu perfil no Medium, publiquei algumas vezes mas tomei um balde de água fria no dia em que, com meu computador no conserto, decidi escrever alguma coisa pelo celular. O app móvel, que um dia já foi muito bom e permitia a edição e mesmo a publicação de textos, hoje em dia não tem a opção.

A ideia do Medium, de ser quase que uma “rede social de texto”, é interessante, mas falha. Pois além de funcionar na mesma lógica algorítmica, também despreza justamente o meio pelo qual boa parte das pessoas acessa e produz conteúdo na internet hoje em dia: o celular.

Não pretendo abandonar o Medium, mas também não o WordPress. Tenho um carinho por este espaço que mantenho há 15 anos, e não posso deixá-lo de lado.

E se passaram 15 anos

Em 25 de maio de 2015, publiquei o texto de despedida do Cão Uivador, dando fim ao blog que havia começado havia oito anos e onze dias, em 14 de maio de 2007. Achava que não fazia mais sentido manter o Cão sem a frequência de atualizações que ele tinha de 2007 a 2013.

Ao encerrar o Cão (que permaneceu no ar, apenas sem atualizações), criei outro blog cujo nome era o meu, e que teve curta duração: em setembro de 2015 comecei a escrever no Medium, que era a “febre” do momento. Em fevereiro de 2017 resolvi retomar o blog com o meu nome para “reflexões pessoais” enquanto o Medium seria para “temas relevantes”. (Quanta pretensão…)

Consequência disso: quando o Cão completou 10 anos, em 14 de maio de 2017, ele estava inativo. Não teve postagem, não teve nada.

Em fevereiro de 2018 tomei a única decisão moralmente aceitável no tocante à minha escrita na internet: reativar o Cão Uivador. Tempos depois, importei todos os textos do blog “meu xará” (que deixou de existir) para o Cão.

Mas o reinício não foi nos mesmos moldes de 2007 a 2013. Já anunciava que não teria atualizações frequentes: a pretensão era apenas tentar voltar a escrever com mais frequência – no que falhei miseravelmente em vários períodos.

Graças a isso, desde então o Cão teve “falhas” mas nunca mais me passou pela cabeça a ideia de encerrá-lo novamente. E também posso escrever aqui que hoje ele completa 15 anos. Sendo assim bem mais longevo que a maioria esmagadora dos blogs que conheço.

O começo dele foi num período muito especial da minha vida: a participação do Grêmio na Libertadores de 2007. Que não acabou em título, mas foi marcada por inesquecíveis partidas no Olímpico Monumental – foi ele que levou o Tricolor até a final. Não ao acaso, no período de 2007 a 2013 o futebol foi dos temas mais frequentes por aqui: além de Grêmio, também teve Copa do Mundo em 2010 (foi graças a ela que o Cão teve sua maior audiência diária na véspera da abertura do torneio na África do Sul, quando a galera buscava palpites para seus bolões).

Um tema que segue frequente é política. A eleição de 2010 também deu bastante visibilidade ao Cão, que se tornou parte da chamada “blogosfera progressista”, de muita importância naquela época mas que logo depois começou a minguar, pelos mais diversos motivos. Porém, não apenas ela: o que “matou” a maioria dos blogs foi o “roubo” da audiência pelo Facebook, onde se costumava divulgar os links dos textos – aí as pessoas comentavam no post da rede ao invés de clicarem para ler e comentar nos blogs, e no fim das contas muita gente começou a escrever direto no Facebook pois queriam que suas palavras fossem, afinal de contas, lidas.

Por conta disso, penso que os 15 anos do Cão merecem muito ser celebrados, com direito a brinde (mesmo que só virtual). Ainda que com poucas atualizações e pouca repercussão na comparação com dez anos atrás, manter por tanto tempo um blog independente em tempos de burrice empoderada e pessoas com preguiça de clicar em links que as tirem de suas bolhas construídas por algoritmos é, de certa forma, um ato de resistência.

Que venham mais 15, mais 30, mais muitos anos de Cão Uivador. E que os próximos tempos, por favor, sejam melhores: chega de burrice! E que em 2023, para falar do Grêmio, o campeonato seja a Série A…


E num sinal dos novos tempos caninos, o texto de comemoração foi escrito no improviso, aos 45 do segundo tempo…

Encerrando uma longa ausência

Desde o começo da pandemia eu não passava tanto tempo sem aparecer por aqui. Mais de dois meses.

Nesse meio tempo a guerra da qual falei no último texto não apenas não teve um fim, como se intensificou. Quase 60 anos após a crise causada pelos mísseis soviéticos em Cuba (outubro de 1962), se volta a falar em Terceira Guerra Mundial.

Mas nesse meio tempo também tirei férias de verdade pela primeira vez desde 2019. Fui conhecer Curitiba, e voltei a visitar Florianópolis. Era uma arejada na cabeça da qual estava precisando muito, mesmo tendo viajado a Rio Grande no começo do ano (foram poucos dias e sem poder aproveitar mais pois era o começo da onda da variante ômicron).

Voltei lamentando não só pelo fim das férias, como também por Porto Alegre não ser um pouco como as duas cidades. É bem verdade que não temos a mesma paisagem que Florianópolis, mas acho que a cidade onde nasci e vivo desde então (excetuando o ano e meio que morei em Ijuí) tem suas belezas que fazem ela valer a pena, e deveriam mesmo ser mais valorizadas. O pior é não termos a organização de Curitiba: isso daria para mudar se votássemos melhor. (Votar em qualquer porcaria por medinho da esquerda, como fizemos em 2020, dá nisso.)