Em fevereiro, questionei se a ditadura de Muammar al-Gaddafi na Líbia estava realmente chegando ao fim. Afinal, dada a velocidade com que caíram os regimes ditatoriais em dois países vizinhos (Tunísia e Egito) no início do ano, parecia que não demoraria muito para Gaddafi ter destino semelhante aos que tiveram o tunisiano Ben Ali e o egípcio Hosni Mubarak.
Porém, a longa ditadura iniciada em 1969 não caiu tão rapidamente. Foi preciso uma guerra civil. Num comparativo da chamada Primavera Árabe com as quedas dos regimes “socialistas” no Leste Europeu em 1989, Muammar Gaddafi agiu de forma semelhante ao romeno Nicolae Ceausescu: ambos acreditaram que eram amados pelo povo, e decidiram resistir. Na Romênia a guerra civil foi breve (durou pouco mais de uma semana) e resultou na execução do ditador e de sua esposa. Já a Líbia vive um conflito que ainda parece longe de acabar: Gaddafi já pode ser considerado ex-ditador, mas seus apoiadores não parecem dispostos a deporem as armas. Ainda mais que o líder, a princípio, está vivo, mas em local desconhecido.
Aliás, a citação ao “socialismo” do Leste Europeu não foi só para comparar Gaddafi a Ceausescu. Pois algo me incomoda: muita gente que se considera de esquerda apoia Gaddafi por seu suposto “anti-imperialismo”. Até reconhecem que os regimes da Europa Oriental eram burocráticos, autoritários e muito distantes do ideal socialista, mas não percebem que Gaddafi era também um ditador. E, principalmente, que há certo tempo ele nem era mais um “inimigo dos Estados Unidos”. Aliás, virou tão amigo, que os serviços secretos estadunidense e britânico colaboraram com seu regime por pelo menos cinco anos (2002-2007), inclusive entregando opositores da ditadura!
Aí alguém vai perguntar por que a OTAN bombardeia a Líbia, em suposto apoio os rebeldes que lutam contra a ditadura. A resposta é bem simples: oportunismo. Afinal, se o amiguinho Gaddafi está podre e vai cair, melhor derrubá-lo de uma vez e instalar um novo governo que se mantenha alinhado ao Ocidente, ao invés de correr o risco da revolta popular resultar numa Líbia verdadeiramente democrática e anti-imperialista.
Por isso, é importante que o povo líbio não se contente com a queda de Gaddafi: é preciso garantir que a vitória seja, realmente, dos líbios, e não do Ocidente.
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Outro ditador intragável é Bashar al-Assad, da Síria. Como defender quem massacra o povo com tanques de guerra para se manter no poder??? Mas, há gente de esquerda que o considera “anti-imperialista”… É dose.