Baseado em fatos reais.
Aproxima-se o final do expediente. Momento tão desejado por tantos, mas não por Eduardo, no dia de hoje. A hora de ir embora é detestada como se fosse o fim das férias, o toque do despertador ou a música do Fantástico.
O que há de tão diferente em comparação com outros dias? A temperatura. Quando falam em 30 graus, Eduardo lembra com saudade de quando o termômetro marcava isso. Ultimamente são 38, 39, até mesmo 40 graus. “Mais do que frente fria, a cidade precisa mesmo é de dipirona”, pensa.
Ao contrário de outros dias, este passou correndo. Justamente porque era para ser mais longo. Eduardo procura retardar o máximo possível sua saída, mas não adianta: é preciso ir embora. Mas não sem tomar as necessárias precauções: após bater o ponto, vai ao banheiro e troca a roupa, substituindo a calça por uma bermuda. Durante o dia não sofreu por conta do ar condicionado, mas sabe que na rua a história é diferente.
Geralmente, Eduardo caminha do trabalho para casa. É um ótimo exercício, para o corpo e para a mente. Às vezes, faz uma parada em um bar no caminho (ocasiões em que o exercício para o corpo é anulado), toma uma cerveja e pensa na vida.
Mas hoje, o trajeto será feito de ônibus. Com todo esse calor, é melhor trocar a caminhada pelo ar condicionado do coletivo, mesmo vestindo bermuda.
Ao sair do prédio, acontece o que não podia acontecer: o ônibus já está passando e Eduardo o perde, por ter demorado mais tempo para sair do que em outros dias. Consultara a tabela de horários e esta indicava que o próximo ônibus demoraria bastante a passar; seria preciso aguardar um longo tempo, e em uma parada no sol abrasador.
Eduardo desiste desta linha. Resolve pegar um outro ônibus, mas para isso é preciso caminhar duas quadras. Mesmo que haja sombra em boa parte do trajeto (graças a uma rua arborizada), não é fácil. Por isso, entra em um mercadinho e decide comprar uma bebida. A lata de cerveja está lá, bastante sedutora, mas Eduardo prefere água. Paga pela garrafa e volta ao calor da rua.
Chegando à rua pela qual passa o ônibus, Eduardo constata algo desolador: a parada também fica no sol. Olha ao redor, procura outra na mesma rua, mas nenhum sinal. Tem duas escolhas: esperar ali mesmo, ou seguir caminhando. Decide pela segunda opção.
A rua pela qual Eduardo caminha em direção à sua casa é bastante arborizada. Ele anda lentamente, de modo a suar o mínimo possível; é notável que faz menos calor na rua pela qual caminha em comparação com outras. Lembra, indignado, de árvores que foram derrubadas para alargar e descongestionar avenidas que já estão novamente congestionadas: “o prefeito deveria é andar na rua a pé, para ter noção de como ruas com árvores são mais agradáveis”.
Chegando ao final da rua, vem o desafio de atravessar uma avenida. Do outro lado, ao menos, há um um parque. Por dentro dele, segue o caminho de Eduardo até sua casa em um dia infernal. Ainda há água dentro da garrafa, o suficiente para atravessar o parque – depois dele, em outra avenida, há outro mercadinho onde é possível comprar mais água.
A travessia do parque se dá sem problemas. É a parte mais agradável do trajeto: embora ainda muito quente, é menos poluída – tanto atmosférica como sonoramente.
Eduardo não para no bar: embora a água já tenha acabado, faltam poucas quadras para chegar em casa. O trecho final da caminhada é feito na mesma velocidade, para evitar o maior desgaste.
Chegando em casa, é que o suor começa a literalmente escorrer, até mesmo a pingar. Nem pensa duas vezes: tira a roupa e corre para o banho “frio” – que também é quente. Debaixo do chuveiro, pensa no dia de amanhã, torcendo para sair a tempo de pegar o ônibus. E, mesmo acordado, sonha com o outono.