Henrique Capriles, um mau perdedor

Quando postei ontem sobre o resultado da eleição presidencial na Venezuela, disse que o fato do oposicionista Henrique Capriles não reconhecer a vitória de Nicolás Maduro poderia resultar em violência nas ruas, visto que a direita venezuelana já fez isso em abril de 2002, no golpe que tirou Hugo Chávez do governo por 48 horas.

Pois já estava acontecendo. Partidários de Capriles atenderam ao chamado do oposicionista e foram às ruas, porém, muitos não se limitaram ao protesto pacífico e partiram para a violência, que deixou pelo menos sete mortos e 61 feridos.

Ou seja, Capriles demonstra, acima de tudo, que é um mau perdedor. Segundo a TeleSur (cuja sede em Caracas foi cercada por militantes oposicionistas), o candidato da direita sequer formalizou o pedido de recontagem de votos que ele dissera que ia solicitar. Ou seja, demonstra ter certeza de que perdeu a eleição. Mas, parecendo uma criança birrenta, esperneia e não aceita a derrota.

O problema é que essa “criança birrenta” é também “mimada”: sua gritaria animou o governo dos Estados Unidos, que não reconhece o resultado da eleição (mesmo que o sistema de votação na Venezuela seja muito elogiado, inclusive pelo Centro Carter de Estudos, liderado pelo ex-presidente estadunidense Jimmy Carter). E assim, essa “birra”, que ainda ganhou um “mimo”, pode acabar nada bem.

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O grande erro político de Hugo Chávez

Algo que já disse várias vezes, e que novamente repito: a aprovação pelo povo venezuelano da reeleição ilimitada em referendo realizado em fevereiro de 2009 foi uma aparente vitória do presidente Hugo Chávez, que ganhou o direito de se candidatar novamente à presidência em 2012. Assim aconteceu, e em outubro passado, os venezuelanos deram mais um mandato a Chávez.

O fato da vitória ser “aparente” ficou claro quando Hugo Chávez anunciou que tinha câncer, em junho de 2011. Não tivesse se empenhado tanto em mudar a constituição para poder se reeleger mais vezes (inclusive alcançado tal objetivo), Chávez teria forçado seu partido, o PSUV, a formar novas lideranças em condições de dar continuidade a seu projeto político – e isso já teria começado bem antes de 2011.

Resultado: o povo não votava em um projeto político, e sim, no líder que encarnava uma espécie de “salvador da pátria”. Prova disso é que Nicolás Maduro, o candidato indicado por Chávez (apenas em dezembro de 2012), venceu, mas por uma margem muito pequena, inferior a 2%. A expressiva votação do oposicionista Henrique Capriles assanhou a oposição, que solicitou auditoria dos votos (pedido prontamente aceito por Maduro) e recusa-se a aceitar a vitória do candidato governista, o que pode resultar inclusive em violência nas ruas, dado o histórico da direita venezuelana.

Ou seja, das urnas emerge uma Venezuela praticamente dividida ao meio. A eleição de Maduro mostra que um chavismo sem Hugo Chávez não é impossível (afinal, vitória apertada não deixa de ser vitória), mas é muito mais fraco na ausência de seu líder. Justamente por ser um projeto político extremamente vinculado a Chávez.

Chávez: sai o líder, entra o mito

Hugo Chávez é um demônio. Por quê? Porque alfabetizou 2 milhões de venezuelanos que não sabiam ler nem escrever, mesmo vivendo em um país detentor da riqueza natural mais importante do mundo, o petróleo.

(Eduardo Galeano: “A demonização de Chávez”

Pretendo escrever um texto mais aprofundado sobre Hugo Chávez, postando-o talvez no final de semana. Mas uma coisa já posso afirmar sem medo de errar: o presidente venezuelano deixa a vida para se tornar, definitivamente, um mito.

O documentário “A revolução não será televisionada” dá uma amostra. Afinal, não é qualquer líder político que reduz drasticamente a pobreza e a desigualdade, praticamente erradica o analfabetismo, e não bastasse isso, resiste a um golpe de Estado.

Pedra cantada há quatro anos

Porém, como ninguém está livre de nada, e se acontecer algum problema que impeça Hugo Chávez de continuar, quem o substituirá? Não há a preocupação de se lançar novas lideranças dentro do próprio partido de Chávez, que possam sucedê-lo sem dificuldades.

Escrevi o parágrafo acima em fevereiro de 2009, quando os venezuelanos aprovaram, em referendo, o fim do limite de reeleições consecutivas para cargos executivos. Foi, aparentemente, uma vitória do presidente Hugo Chávez.

Ao contrário do que os ingênuos acreditam, a medida não beneficiou apenas Chávez: a mudança foi na constituição, ou seja, todos os ocupantes de cargos executivos na Venezuela podem concorrer indefinidamente à reeleição. Logo, prefeitos e governadores oposicionistas também se deram bem.

Mas o principal motivo pelo qual a vitória foi aparente, agora é entendido – embora não sem aviso, como prova o texto de quatro anos atrás. Antes da emenda constitucional ser aprovada, Chávez não poderia ser candidato à presidência em 2012. Desta forma, seu partido precisaria se preocupar em formar novas lideranças em condições de dar continuidade a seu projeto político – o que seria ótimo para o chavismo, que deixaria de ser vinculado apenas a Chávez.

Não foi o que aconteceu: com Chávez podendo concorrer indefinidamente, a possibilidade dele não ter condições de continuar na presidência acaba gerando uma grande incerteza na Venezuela. Caso a emenda não tivesse sido aprovada em 2009, na próxima quinta-feira um novo presidente (provavelmente vinculado ao chavismo) seria empossado em situação que, embora não de normalidade (afinal, Chávez estaria ausente da cerimônia de transmissão do cargo devido às suas condições de saúde), seria bem mais tranquila em termos políticos.

Ah, se fosse na Venezuela…

Hoje pela manhã, um grupo de policiais foi ao DCE da USP para “pedir” aos alunos que deixassem o local devido a uma (suposta) reforma a ser empreendida pela reitoria (à qual os estudantes se opõem, assim como à presença da PM no campus). Um policial “achou” que um dos jovens presentes – coincidentemente, o único negro – não era aluno da USP, e “pediu” para que se identificasse. O estudante recusou-se a mostrar sua carteirinha ao PM e por isso foi agredido pelo mesmo, que ainda por cima sacou sua arma e a apontou para o jovem.

Depois, o mesmo policial tapou sua identificação no uniforme e recusou-se a dizer seu nome aos estudantes que o questionavam. Ué, mas o aluno agredido não o foi por não querer se identificar? Achei que a polícia deveria dar exemplo, e não adotar a filosofia do “faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço” para reprimir utilizando-se do argumento “minha autoridade foi desacatada!”.

Nos comentários dos vídeos no YouTube, claro, os fascistas de sempre vomitam os mesmos bostejos. “Bando de maconheiros, tem de dar porrada mesmo!”, “vão estudar, vagabundos”, etc., etc.

Agora, imaginem se isso tivesse acontecido na Venezuela, com a polícia agredindo gratuitamente estudantes por eles protestarem contra o governo de Hugo Chávez…

Câncer de Chávez é ameaça a seu projeto político

O que era rumor, se confirmou ontem. O presidente venezuelano Hugo Chávez, em pronunciamento à TeleSur, admitiu estar combatendo um câncer.

Mesmo estando em Cuba para o tratamento de saúde, Hugo Chávez não transmitiu interinamente o cargo ao vice-presidente Elias Jaua, gerando protestos da oposição. Chávez diz estar acompanhando e liderando as questões políticas na Venezuela.

Em fevereiro de 2009, logo que a população venezuelana aprovou em referendo a reeleição ilimitada para cargos executivos, escrevi sobre o assunto, defendendo que, ao contrário do que muitos apoiadores pensam, tal medida era prejudicial a seu projeto político. Pois este é vinculado a apenas a uma pessoa, o próprio Hugo Chávez, não havendo a preocupação em se formar novas lideranças dentro de seu partido – e com o fim do limite de reeleições, se passou a pensar menos ainda em alguém que possa suceder Chávez sem dificuldades caso ele não possa mais ser o presidente.

Pois tal situação parece mais próxima: embora Chávez diga que o tratamento do câncer esteja evoluindo bem, sabemos como tal doença é traiçoeira, muitas vezes voltando quando se acredita estar livre dela. E a próxima eleição presidencial na Venezuela ocorrerá no final do próximo ano… Chávez terá condições de continuar?

Uma boa prova da parcialidade da mídia corporativa

Na próxima quarta-feira, 2 de fevereiro, Hugo Chávez completa 12 anos na presidência da Venezuela. Os principais “opinistas” não hesitam em qualificá-lo como “personalista”, “aprendiz de ditador”, isso quando não o chamam de “ditador” mesmo.

No dia 14 de outubro, Hosni Mubarak completa 30 anos na presidência do Egito (se o povo não derrubá-lo antes, a exemplo do que aconteceu com Ben Ali na Tunísia). E só agora que percebo a palavra “ditador” acompanhando seu nome na mídia corporativa – provavelmente porque vai pegar mal para os “democratas” não o chamarem assim quando o povo sai às ruas contra seu governo.

E olha que Chávez se mantém no poder ganhando eleições reconhecidamente limpas. Já Mubarak, só foi enfrentar um opositor nas urnas em 2005 – num processo eleitoral marcado por denúncias de fraude.

A diferença entre eles, mais do que o tempo no poder (e sem falar em suas linhas políticas), é que Mubarak é aliado dos Estados Unidos, e Chávez não…

A maior piada do ano (até agora)

Ontem, no fórum defensor da liberdade só para quem tem dinheiro (“e quem não tem que se dane” – eles não dizem abertamente mas certamente é o que pensam), foi dada um prêmio de “liberdade de imprensa”… A um golpista!

O premiado foi Marcel Granier, diretor-presidente da RCTV, emissora de televisão que foi uma das principais apoiadoras do golpe militar na Venezuela em 11 de abril de 2002. Os falsos democratas que derrubaram Hugo Chávez por dois dias instalaram uma ditadura de verdade (sorte que durou pouco): dissolveram o parlamento, a Suprema Corte e o Conselho Nacional Eleitoral; destituíram todos os governadores, prefeitos, conselheiros, dentre diversos outros cargos.

Ah, e o premiado por “defender a liberdade de imprensa” apoiou um governo que a combateu: a Venezolana de Televisión, emissora pública, teve seu sinal cortado pelos golpistas – afinal, fora a única a não aderir à quebra da ordem constitucional.

Bem diferente do que aconteceu com a RCTV, que transmitiu seu sinal na TV aberta por mais cinco anos, até o vencimento da concessão em 2007.

E Granier disse que o prêmio é algo que ele “preferia não ter recebido”. É, acho que apesar de tudo o que fez, o sujeito tem consciência e ela pesou…

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Além do prêmio de “liberdade de imprensa”, o presidente da entidade que organiza o evento disse que “os direitos humanos não podem se sobrepor ao direito de propriedade”. Ou seja: se for for preciso uma ditadura… Ué, e a liberdade que eles tanto defendem?

Quem é o maior “perigo mundial”?

Até 1979, o Irã era uma monarquia pró-Ocidente. Com a Revolução Islâmica, “o jogo virou”, e o país passou a ser visto como “ameaça” pelos antigos aliados.

Então entrou em cena Saddam Hussein, ditador do Iraque. Armado pelos Estados Unidos, invadiu o Irã e deu início a uma longa guerra (1980-1988), que deixou mais de um milhão de vítimas e acabou “empatada”. Saddam usou armas químicas e biológicas contra iranianos e curdos.

Com a economia debilitada após o conflito, o Iraque, rico em petróleo, desejava que o valor do barril fosse aumentado, o que obviamente não era desejado pelo Ocidente. Em agosto de 1990, Saddam Hussein ordenou a invasão e anexação do Kuwait, riquíssimo em petróleo, que assim como a Arábia Saudita era aliado dos países ocidentais e não aumentava o preço do barril. Foi o que motivou a Guerra do Golfo de 1991, após a qual o Iraque sofreu sérias sanções econômicas, e Saddam foi acusado de possuir “armas de destruição em massa” – pelos países que mais as possuem e, pasmem, que o armaram e o apoiavam quando as utilizou.

Ao longo da década de 1990, as acusações ao Iraque quanto à posse de “armas de destruição em massa” continuaram. O país seria novamente bombardeado em 1996 e 1998, quando o presidente estadunidense Bill Clinton precisava “agradar à opinião pública” nos Estados Unidos: na primeira oportunidade, Clinton concorria à reeleição; na segunda, corria risco de impeachment por conta de um escândalo sexual.

Após os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001, o presidente George W. Bush incluiu o Iraque no “eixo do mal”, lista dos países contrários aos interesses dos Estados Unidos, sob o pretexto de “apoiar o terrorismo”. Ao longo de 2002 procurou, sem sucesso, convencer o mundo inteiro de que Saddam Hussein era uma ameaça igual ou maior que Osama Bin Laden, que o mundo inteiro corria perigo.

Saddam decidiu permitir a visita de inspetores da ONU, em busca das tais “armas de destruição em massa” que supostamente o Iraque teria. Nada foi encontrado. Já Bush e sua claque juravam de pés juntos que Saddam possuia sim as tais armas, para justificarem a guerra. Ignoraram a ONU e os protestos em todos os cantos do mundo, e em 20 de março de 2003 iniciaram a invasão do Iraque.

Seis anos depois, nenhuma “arma de destruição em massa” foi utilizada contra o invasor, nem sequer encontrada. Sinal de que Saddam não tinha mais nenhuma. O país foi loteado entre empresas privadas que auxiliariam na “reconstrução”: a “liberdade” de Bush destruiu o Iraque, para permitir a entrada das grandes corporações “de bem” lá.

Saddam Hussein foi capturado no final de 2003, julgado e condenado à morte, sendo executado em 30 de dezembro de 2006. Foi um julgamento muito longe de ser justo: embora Saddam tenha sido um ditador cruel, deveria ter sido submetido a um tribunal neutro, fora do Iraque ocupado por forças estrangeiras.

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Por que lembrei tudo isso? Para alertar do perigo que são esses coros de “fulano é um perigo regional/mundial”. Afinal, eles partem de onde está o verdadeiro perigo.

A “bola da vez” é Hugo Chávez. Tudo bem, não é de hoje que ele vem sendo tratado como um “monstro ameaçador”, mas agora a campanha reacionária parece estar se intensificando, com essas tais “marchas” contra ele, orquestradas pelo governo da Colômbia para ocorrerem em vários países.

Mas são milhões assistindo televisão, que apenas fala mal de Chávez sem contraponto. Muitas pessoas que podem acabar incorporando o discurso reacionário sem se darem conta disso, que nem acontece em relação às medidas tipicamente nazistas.

Ora, quem acusa Chávez?

  • Governo dos Estados Unidos. O mesmo que é contra certos países terem armas de destruição em massa, mas as tem aos montes. Assim como no caso do Iraque, o interesse não é a paz mundial ou a democracia: “é o petróleo, estúpido!”. Barack Obama pode até parecer menos ameaçador que George W. Bush, mas é presidente dos Estados Unidos. Como já foi lembrado, Bill Clinton (do mesmo Partido Democrata de Obama) bombardeou o Iraque quando a coisa tava feia em casa, no final de 1998;
  • Governo da Colômbia. O presidente Álvaro Uribe acusa Chávez de envolvimento com as FARC, que por sua vez são acusadas de tráfico de drogas. Porém, o próprio Uribe é acusado de ser um grande narcotraficante. Demonstra não respeitar a soberania dos países vizinhos, quando ainda defende a ação militar que violou a fronteira do Equador em março de 2008, para matar guerrilheiros das FARC;
  • Mídia corporativa. A mesma que apoiou o golpe de 1964 no Brasil e o recente em Honduras, “em defesa da democracia”, acusa Chávez de ser “ditador”. Chiou quando foi aprovada a emenda constitucional na Venezuela que acabou com o limite de mandatos consecutivos – tanto para Chávez quanto para governadores e prefeitos, inclusive os oposicionistas – mas não fez o mesmo agora que o presidente colombiano Álvaro Uribe também poderá concorrer a mais um mandato. E a mesma que chorou a não-renovação da concessão da RCTV em 2007 apoiou os golpistas que fecharam o canal público venezuelano por dois dias em abril de 2002, e não divulgou nada quando o povo saiu às ruas para pedir a volta de Chávez.

Diante de acusadores assim, é possível acreditar que o perigo é Hugo Chávez? Sim, desde que não se divulgue quem está por trás da campanha contra o presidente venezuelano.

Chávez nunca ordenou ao exército da Venezuela que violasse a soberania de outros países, nem sequer pediu à Rússia ou outro país que não se dê lá muito bem com os Estados Unidos para instalar bases militares em território venezuelano.

Honduras, por Latuff

Golpe_Honduras___Latuff

Falei muito sobre as gripes (A e Y), e lembrei que me esqueci (lembrar que me esqueci é boa) de Honduras nas últimas semanas. Onde os golpistas continuam a usurpar o governo das mãos do presidente legítimo, José Manuel Zelaya.

O que não é visto com maus olhos pela mídia corporativa, que odeia Hugo Chávez e seus aliados – caso de Zelaya. E sonha com outros golpes pela América Latina, para “destituir” governos que não sejam de seu agrado.