E se passaram 15 anos

Em 25 de maio de 2015, publiquei o texto de despedida do Cão Uivador, dando fim ao blog que havia começado havia oito anos e onze dias, em 14 de maio de 2007. Achava que não fazia mais sentido manter o Cão sem a frequência de atualizações que ele tinha de 2007 a 2013.

Ao encerrar o Cão (que permaneceu no ar, apenas sem atualizações), criei outro blog cujo nome era o meu, e que teve curta duração: em setembro de 2015 comecei a escrever no Medium, que era a “febre” do momento. Em fevereiro de 2017 resolvi retomar o blog com o meu nome para “reflexões pessoais” enquanto o Medium seria para “temas relevantes”. (Quanta pretensão…)

Consequência disso: quando o Cão completou 10 anos, em 14 de maio de 2017, ele estava inativo. Não teve postagem, não teve nada.

Em fevereiro de 2018 tomei a única decisão moralmente aceitável no tocante à minha escrita na internet: reativar o Cão Uivador. Tempos depois, importei todos os textos do blog “meu xará” (que deixou de existir) para o Cão.

Mas o reinício não foi nos mesmos moldes de 2007 a 2013. Já anunciava que não teria atualizações frequentes: a pretensão era apenas tentar voltar a escrever com mais frequência – no que falhei miseravelmente em vários períodos.

Graças a isso, desde então o Cão teve “falhas” mas nunca mais me passou pela cabeça a ideia de encerrá-lo novamente. E também posso escrever aqui que hoje ele completa 15 anos. Sendo assim bem mais longevo que a maioria esmagadora dos blogs que conheço.

O começo dele foi num período muito especial da minha vida: a participação do Grêmio na Libertadores de 2007. Que não acabou em título, mas foi marcada por inesquecíveis partidas no Olímpico Monumental – foi ele que levou o Tricolor até a final. Não ao acaso, no período de 2007 a 2013 o futebol foi dos temas mais frequentes por aqui: além de Grêmio, também teve Copa do Mundo em 2010 (foi graças a ela que o Cão teve sua maior audiência diária na véspera da abertura do torneio na África do Sul, quando a galera buscava palpites para seus bolões).

Um tema que segue frequente é política. A eleição de 2010 também deu bastante visibilidade ao Cão, que se tornou parte da chamada “blogosfera progressista”, de muita importância naquela época mas que logo depois começou a minguar, pelos mais diversos motivos. Porém, não apenas ela: o que “matou” a maioria dos blogs foi o “roubo” da audiência pelo Facebook, onde se costumava divulgar os links dos textos – aí as pessoas comentavam no post da rede ao invés de clicarem para ler e comentar nos blogs, e no fim das contas muita gente começou a escrever direto no Facebook pois queriam que suas palavras fossem, afinal de contas, lidas.

Por conta disso, penso que os 15 anos do Cão merecem muito ser celebrados, com direito a brinde (mesmo que só virtual). Ainda que com poucas atualizações e pouca repercussão na comparação com dez anos atrás, manter por tanto tempo um blog independente em tempos de burrice empoderada e pessoas com preguiça de clicar em links que as tirem de suas bolhas construídas por algoritmos é, de certa forma, um ato de resistência.

Que venham mais 15, mais 30, mais muitos anos de Cão Uivador. E que os próximos tempos, por favor, sejam melhores: chega de burrice! E que em 2023, para falar do Grêmio, o campeonato seja a Série A…


E num sinal dos novos tempos caninos, o texto de comemoração foi escrito no improviso, aos 45 do segundo tempo…

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Datas ainda mais redondas

Duas semanas atrás escrevi, com certo atraso, sobre duas efemérides: meus 40 anos e os 10 anos da minha “fake news” preferida.

Agora, sem atraso, falo de uma data ainda mais “redonda”, com QUATRO zeros.

Hoje, 2 de novembro de 2021, faz 10.000 (DEZ MIL) dias que começou o MAIOR EVENTO DA HISTÓRIA DO UNIVERSO. Óbvio que falo dela, a COPA DO MUNDO DE 1994.

Pois é, não basta fazer 40 anos, agora lembrarei de dias com os quais ainda SONHO com essa SOMBRA DOS QUATRO ZEROS.

Lembro de quando se falava sobre a Seleção de 1994 jogar “feio” (e não sem alguma razão) apesar de ganhar. Além de lembrarem do time de 1982, também sobravam menções a 1970, quando o Brasil ganhou e jogou bonito.

Aquele “tiozão saudosista” lá de 1994, em 2021… Sou eu!

16 de maio

Amanhã, meu irmão completa 36 anos de vida, o que faz do 17 de maio um dia muito importante para mim.

Mas o dia de hoje também tem significado nos últimos cinco anos.

Foi em 16 de maio de 2016, no início da tarde, que recebi e-mail de uma colega de trabalho aqui de Porto Alegre que desejava voltar a morar em Ijuí e por isso queria saber se eu mantinha minha vontade de me transferir para a capital.

Por alguns segundos fiquei na dúvida, que obviamente não duraria muito. Sim, eu queria.

À noite (mais precisamente, à meia-noite) eu faria uma chamada pelo Skype para o meu irmão, por conta do aniversário dele. Passei boa parte do dia na dúvida sobre contar ou não que tinha possibilidade de retornar a Porto Alegre.

Perto da meia-noite, decidi contar. Pois mais cedo ou mais tarde eu faria isso, então que fosse em uma ocasião festiva.


Nestes últimos cinco anos, muitas vezes pensei se acertei ou não naquele 16 de maio. Em especial desde que começou a pandemia: ficar em casa num apartamento com sacada (como aquele no qual eu morava em Ijuí) seria bem melhor do que onde moro agora. Sem contar que um ano e sete meses não foi suficiente para eu conhecer mais a cidade.

Mas, em compensação, a distância da família era o fator principal. Por ter voltado, pude ficar perto de minha avó nos anos finais da vida dela (exceto nos últimos três meses por conta do isolamento pandêmico); também pude acompanhar bastante minha mãe após a cirurgia cardíaca que fez no começo de 2021.

Ultimamente, estou mais convicto de que acertei em retornar para Porto Alegre. E ao mesmo tempo, também acho que valeu muito a pena ter morado em Ijuí. Foi uma excelente experiência de vida, que recomendo a muitas pessoas que nunca viveram fora de capitais e têm uma visão bastante estereotipada do que é o interior.

Talvez um dia novamente eu deixe de morar em Porto Alegre. Mas por enquanto, não o farei, apesar da “politização” da população local

Isso vai acabar um dia?

Um ano atrás, eu recém havia lido uma matéria na BBC Brasil sobre o chamado “distanciamento social intermitente”, que consistiria num “revezamento” entre medidas de restrição e relaxamento de acordo com as taxas de contágio da covid-19, que poderia durar até 2022. Minha primeira reação à leitura foi: “bah, que exagero, em menos de um ano certamente já teremos vacina e/ou remédio, já que a ciência está priorizando o combate à pandemia”.

É bem verdade que em maio de 2020 eu já deveria “ter posto as barbas de molho”. Afinal, em março eu dizia “vamos ficar uns dois meses em casa e depois tudo volta ao normal”. Os dois meses passaram e tinha ficado óbvio que a coisa não passaria tão rápido assim… Mas demorar mais um ano já me parecia muito pessimismo. Dois, então, era coisa de catastrofista.

Agora, em maio de 2021, já acho bem otimista aquela previsão da matéria. Pelo menos em termos de Brasil. Afinal, mesmo que já exista vacina, moro em um país “governado” por Jair Bolsonaro. Onde todos os dias morrem milhares de pessoas por uma doença contra a qual já há uma vacina – mas que não chegou a braços suficientes porque o presidente fez de tudo por isso.


Exatamente um ano atrás, Aldir Blanc falecia, entrando na lista das muitas milhares de vítimas do genocídio pandêmico no Brasil. Como uma forma de homenagem, trabalhei em casa nesta terça-feira ouvindo diversas músicas compostas por ele. Uma das mais conhecidas é “O Bêbado e a Equilibrista”, que na voz de Elis Regina virou um hino informal da abertura política no Brasil do final da década de 1970.

Alguns de seus versos dizem muito sobre a época que vivemos (infelizmente, uma música de 1979 voltou a ser muito atual mais de 40 anos após seu lançamento).

Chora
A nossa Pátria mãe gentil
Choram Marias e Clarisses
No solo do Brasil

Se em março de 2020 eu achava que dois meses depois voltaria à vida normal, em maio de 2021 me pergunto até quando minha vida ficará paralisada. Também queria saber até quando chorarão tantas Marias e Clarisses, pela perda de tantas pessoas queridas, no solo do país que é um dos piores do mundo no combate à pandemia.

Afinal de contas, isso vai acabar algum dia?


Da mesma música de Aldir Blanc, destaco outros versos que, espero, digam o que acontecerá no Brasil num futuro muito próximo.

Mas sei que uma dor assim pungente
Não há de ser inutilmente

A anistia de 1979, da qual “O Bêbado e a Equilibrista” virou um hino informal, foi “ampla, geral e irrestrita”. Ou seja, também foi usada para “livrar a cara” de torturadores e outros bandidos que agiram na repressão política da ditadura. Naquela ocasião, o “acordo” para redemocratizar o país consistiu no esquecimento dos crimes cometidos pelo Estado brasileiro.

Agora são mais de 400 mil vítimas de um “governo” que insistiu em medicamentos comprovadamente ineficazes contra a pandemia e se recusou a comprar vacinas cedo. O número obviamente chegará a 500 mil e, quiçá, a um milhão.

Dessa vez não pode haver “anistia ampla, geral e irrestrita”. O Brasil não tem o direito de esquecer as vítimas do genocídio pandêmico.


E este 4 de maio se encerra com a notícia da morte do ator Paulo Gustavo, de 42 anos. Por uma doença contra a qual já existe vacina. Mais uma vítima de Jair Bolsonaro.

O “mea culpa” que mais espero

Muito se cobra a esquerda (em especial o PT) para que faça uma autocrítica. Concordo tanto que inclusive gosto de lembrar que boa parte das pessoas que conheço de tal lado do espectro político já a fez. Eu mesmo venho fazendo há muito tempo.

Os governos de centro-esquerda do PT cometeram muitos erros, ainda que isso não apague seus acertos, que foram em muito maior número. Milhões de pessoas saíram da pobreza extrema (agora infelizmente estão voltando a ela por culpa de decisões tomadas nos últimos cinco anos) por conta de políticas de inclusão social promovidas pelas administrações petistas, foram abertas muitas universidades país afora, e na política externa o Brasil foi respeitado como poucas vezes em sua história (em compensação, agora…). Da mesma forma que as opiniões lamentáveis sobre política e a clara decadência do futebol do Grêmio nos últimos dois anos não me fazem querer “cancelar” Renato Portaluppi, que como jogador ganhou a Libertadores e o Mundial (com direito a marcar os dois golaços da vitória) em 1983; como treinador, tirou o clube de uma fila de 15 anos sem títulos de peso em 2016 ao vencer a Copa do Brasil, e em 2017 ganhou mais uma Libertadores, a terceira da história gremista. (Achei boa a saída, tanto para o próprio Renato como para o Grêmio.)

O “senso comum” associou o PT à “corrupção”, e considero um erro enorme que o partido não tenha agido com firmeza contra ela. Outro, tão grande e que teve o primeiro como uma de suas consequências, foi a política de alianças pela “governabilidade”, visto que era preciso ter uma forte base aliada no Congresso e a esquerda não tinha maioria. Foi ela que nos “legou” Michel Temer, ainda que isso não justifique a traição dele, que conspirou para virar presidente aliado a quem perdeu nas urnas em 2014.

Quem precisa ainda mais fazer autocrítica é a direita liberal – algo do que já falei aqui. Em especial, no tocante a algo que aconteceu há exatos cinco anos: a infame votação do impeachment na Câmara dos Deputados em 17 de abril de 2016, que mais adiante colocaria Temer na presidência. Foi um show de horrores digno de um livro de Stephen King. E que só aconteceu porque os derrotados de 2014 resolveram ganhar no “tapetão”, cansados de perder eleições.

Considerando a crise econômica na qual o Brasil estava entrando e o desgaste natural do PT após tanto tempo no governo, o mais provável é que, se não resolvessem tirar Dilma Rousseff na marra da presidência, em 2018 a oposição liderada pelo PSDB venceria com facilidade. Talvez com Aécio Neves (que quase ganhou em 2014), talvez com Geraldo Alckmin (com mais base eleitoral por ser de São Paulo). Jair Bolsonaro? Acredito que nem se candidataria: sem apoios de peso para sua candidatura, dificilmente abriria mão da mamata de ser deputado (desde 1991) sem fazer nada de útil pelo país.

Com a opção golpista, a direita liberal que a eleição de 2014 manteve na oposição passou a ser governo em 2016, sem votos. Virou também “vidraça”, levando as “pedradas” que o PT levaria sozinho até 2018 caso continuasse no comando do país. O resultado disso, somado à Operação Lava-Jato (que fez boa população da população achar que “político nenhum presta”), foi a eleição de Bolsonaro à presidência, que conseguiu engambelar uma penca de gente dizendo ser “contra tudo o que está aí” e com apoio (mesmo que em alguns casos só no segundo turno) de quem conspirou pela queda de Dilma pois, afinal, “PT nunca mais”. O PSDB, que se tivesse respeitado as regras provavelmente teria sido o vencedor de 2018, viu Alckmin não receber 5% dos votos após dois mandatos consecutivos como governador de São Paulo, ambos conquistados com vitórias em primeiro turno.

Quando se confirmou o que qualquer pessoa bem informada sabia – ou seja, que Bolsonaro não tinha a menor condição de governar o país – boa parte de quem o apoiou “contra o PT” começou a “tirar o corpo fora”, culpando a esquerda – e não seus votos equivocados – pela eleição do pior presidente da história do Brasil. E dê-lhe pedidos de “autocrítica” para quem tanto avisou em 2018 que, ora bolas, não era boa ideia colocar no Palácio do Planalto alguém que defende torturadores, agressões a homossexuais e salários menores a mulheres “pois engravidam”.

Desculpem, mas essa fatura não é nossa. Afinal, não fomos nós que digitamos “17” na urna eletrônica. (Aliás, dois algarismos que em sequência formam o placar daquele famoso Brasil x Alemanha: um bom sinal de que seria motivo de vergonha para o país, mas que nesse caso é bem maior pois na Copa do Mundo era só futebol.)

Rumo aos 31 a 0

“Todo dia é um 7 a 1 diferente” virou gíria no Brasil de depois daquela fatídica semifinal da Copa do Mundo de 2014. E em muitos casos se usa aquele fiasco diante da Alemanha como comparativo para outras situações.

Foi o caso de um meme (no caso, um print do Twitter) que circulou no final de junho do ano passado. Terminava o primeiro semestre de 2020, e na época achávamos que tinha sido tão ruim que era fácil concordar que a última vez que a primeira parte de algo acabara tão mal o Brasil ia para o intervalo do jogo contra a Alemanha perdendo por 5 a 0. Lembro inclusive de meu comentário ao compartilhar o meme: “pela lógica, levamos só mais dois no segundo tempo e tomara que o ‘gol do Oscar’ seja o impeachment”. (Para ver só, eu nem contava com vacina tão cedo…)

O segundo semestre de 2020 não foi como o segundo tempo daquele Brasil x Alemanha. Afinal, em 2014 os alemães só fizeram mais dois gols. Houve um “gol do Oscar” que foi a vacina; o problema é que em time mal treinado o atacante não presta atenção à defesa adversária e vive impedido: o “gol de honra” acabou anulado, e perdemos por 11 a 0.

Mas foi uma derrota honrosa na comparação com 2021, cujo primeiro semestre (pelo menos no Brasil) se encaminha para ser a pior primeira parte de algo desde quando soou o apito encerrando a etapa inicial de Austrália x Samoa Americana, partida válida pelas eliminatórias da Copa de 2002 que completou 20 anos no último domingo e entrou para a história pelo registro da maior goleada em um jogo oficial entre seleções nacionais. No caso, o Brasil vestiu a camisa de Samoa Americana e a covid-19, a da Austrália, que foi para o vestiário pensando se era ou não o caso de recuar o time e segurar a vitória parcial de 16 a 0.

A “retranca” prevaleceu e os australianos “tiraram o pé” no segundo tempo, só marcando mais 15 gols. Placar final: 31 a 0.

Considerando que estamos na metade de abril, na comparação recém passamos a metade do primeiro tempo. Em Samoa Americana x Austrália, o oitavo gol dos “Socceroos” saiu aos 23 minutos e o nono, aos 25. Aos 27, já estava 10 a 0.

Abril de 2021, 2020 ou 1964?

Muitas vezes já comentei que o tempo parece ter se acelerado desde o início da pandemia. Uma sucessão de dias muito parecidos uns com os outros que longe da “lentidão” que caracteriza a monotonia, em conjunto se tornam um “foguete”.

Parece que foi ontem que estive em minha última aglomeração, mas já faz mais de um ano. Quando chegou dezembro de 2020, a impressão era de estar “preso” em março, mês em que tudo parou.

Então veio 2021, passamos por outro março – muitíssimo pior que o de 2020 – e agora entramos no segundo abril pandêmico. Ano passado, foi o mês em que percebi a “aceleração do tempo”, o que só não faz parecer que simplesmente voltamos a abril de 2020 pois agora está muito pior.

Mas também há outros ecos do passado neste abril de 2021. Já faz quase 30 anos que a União Soviética saiu da geopolítica para entrar na história, e ainda há quem acredite em “ameaça comunista”. O que nunca existiu no Brasil, mas os defensores do golpe de 1964 (que completa 57 anos neste 1º de abril) defendem essa mentira com unhas e dentes (e alguns deles, com armas).

E agora, em meio à pandemia, temos um presidente que ao invés de fazer das tripas coração para comprar vacinas e preservar a saúde do povo brasileiro, prefere tramar um autogolpe contra os governadores, todos comunistas. (Atenção: contém ironia.)

Hoje já é 1º de abril de 2021, mas parece que 2020 não acabou. E no que dependesse do mitomaníaco que nos governa, estaríamos presos para sempre no Dia da Mentira de 1964.

30 mil, multiplicados por 10

Ontem, 24 de março de 2021, a Argentina lembrou o 45º aniversário do golpe militar que instaurou a mais sanguinária ditadura pela qual o país já passou. Em apenas sete anos de duração (1976-1983), o chamado “Processo de Reorganização Nacional” causou a morte e/ou o desaparecimento de aproximadamente 30 mil pessoas.

No mesmo 24 de março de 2021, o Brasil ultrapassou a marca de 300 mil mortes por covid-19. Desde o começo da pandemia o governo federal sabotou todas as medidas para combatê-la (distanciamento social, uso de máscaras e vacinação em massa) e ainda inventou um tal de “tratamento precoce” que em muitos casos só piora as coisas. Resolveu “se mexer” (mas só um pouco) quando seu principal adversário político voltou a poder concorrer à presidência.

A jurisprudência moderna argentina considera a morte e/ou desaparição de 30 mil pessoas em sete anos como um genocídio. Jorge Rafael Videla, general que chefiou a ditadura de 1976 a 1981, foi condenado à prisão perpétua e morreu na cadeia aos 87 anos, em 2013. E foi apenas um entre vários militares condenados por crimes contra a humanidade.

A omissão (para dizer o mínimo) do governo brasileiro fez (até agora) dez vezes mais vítimas que a pior ditadura da história argentina. E sete vezes mais rápido.


Lembram do que nosso atual presidente falou em 1999, quando era apenas um exótico deputado do “baixo clero”? Objetivo pessoal alcançado, dez vezes.

Adeus, Brasil?

Resolvi fazer uma enquete no Instagram sobre ir ou não embora do Brasil. Por enquanto, a emigração está vencendo de goleada…

Um dos votos “sim” é meu. Nunca tive tanta vontade de ir embora como neste momento desesperador pelo qual o Brasil passa. São três os fatores que me impedem: família, dinheiro (não tenho o suficiente para me manter por mais de dois meses fora) e pandemia (nenhum país que se preze deixaria entrar oriundos de um lugar onde o vírus corre solto).

A realidade, então, se impõe: não posso realizar minha vontade. Terei de ficar no Brasil.

Mas não ficarei “em vão”. Farei de tudo para sobreviver (na situação atual da pandemia isso não é exagero, só ver a quantidade de jovens sem comorbidades em UTIs) pois, quando isso tudo passar, pretendo pelo menos planejar uma mudança para o interior, onde o custo de vida é mais baixo.

E o fundamental: como graduado em História e testemunha de um genocídio em curso, passarei o resto da vida lembrando por que chegamos a isso. É obrigação moral e dever profissional, ainda que eu não exerça o ofício de historiador.

O meu maior erro em 2018 foi acreditar que o bom senso prevaleceria. Não aconteceu. Muitas pessoas me decepcionaram: o ódio ao PT falou mais alto e tornou aceitável o voto em alguém que defende tortura e fuzilamento de adversários políticos. Aceito desculpas de quem se arrependeu, mas só se ele for real – ou seja, se a pessoa pudesse voltar ao segundo turno daquela eleição, digitaria “13” ao invés de “17” (não aceito voto nulo, pois era um momento em que ninguém deveria se omitir).

Perdoo, mas não esqueço. Uma das minhas virtudes é ter boa memória. Até o último dia da minha vida lembrarei de quem foi, ainda que “sem querer” (querendo?), cúmplice da barbárie.

“Já li esse livro?”

Me fiz tal pergunta várias vezes durante a leitura de “O carisma de Adolf Hitler” – que ainda estou longe de terminar, para que se tenha uma ideia.

O livro de Lawrence Rees fala do nazismo mas em muitos (repito: MUITOS) trechos bastaria trocar nomes e época para que se tivesse um retrato do bolsonarismo. Até mesmo no tocante aos absurdos defendidos por Hitler em Mein Kampf.

“Óbvio que ele não vai fazer tudo isso, é só da boca pra fora”: ouvimos muito esta resposta em 2018 quando falávamos da ameaça representada por Jair Bolsonaro à democracia. E, em outras palavras, foi o que os nazistas responderam a quem alertava sobre Hitler.

Terminará o Brasil de Bolsonaro destruído e envergonhado como a Alemanha de Hitler? Melhor será não pagar para ver e fazer andar o impeachment.