Na última sexta-feira, caminhando em uma rua perto da Praça de Maio, em Buenos Aires, uma placa na calçada me chamou a atenção.
Então olhei para o lado e vi outra.
Então percebi que havia várias, sinalizando que apenas naquele banco, trabalhavam muitas pessoas desparecidas pelo terrorismo de Estado ao qual foi submetida a Argentina no período de 1976 a 1983. Um número pequeno em comparação com as mais de 30 mil pessoas que o regime tratou de fazer sumir.
Segunda-feira, enquanto aguardava a chamada para o voo de volta, decidi ler jornal. Além do tradicional esportivo Olé, também comprei o Página 12. E em suas páginas, havia notas relembrando pessoas cujos desaparecimentos pela ditadura faziam aniversário no dia 3 de junho.
Já li artigos com queixas relativas à “falta de memória” dos argentinos. O que me deixa espantado, pois algo que sempre considerei extramente positivo na Argentina é o esforço para evitar que sua última ditadura, uma das mais sangrentas da história latino-americana, caia no esquecimento. Como mostram as placas, as notas no jornal, os locais onde operava a repressão que foram transformados em centros de memória (como a antiga sede da ESMA, que não consegui visitar devido ao pouco tempo que passei em Buenos Aires)… Além, claro, das Mães e das Avós da Praça de Maio, que continuam a se manifestar defronte à Casa Rosada.
Bom, talvez eu é que esteja mal-acostumado por ser brasileiro: por aqui praticamente não temos memória*, e não são tão poucas pessoas que se referem aos que combateram a ditadura como tendo sido “terroristas”. Enquanto isso, as placas nas calçadas de Buenos Aires lembram quem foram os verdadeiros terroristas.
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* E isso que falamos de uma época que em História corresponde a “ontem”: em se tratando de outro período período vergonhoso de nosso passado, ou seja, os mais de 300 anos de escravidão, o desconhecimento é quase total mesmo que suas heranças ainda sejam muito visíveis.