Há exatos 10 anos, em 25 de janeiro de 2001, tinha início em Porto Alegre o primeiro Fórum Social Mundial. O encontro das esquerdas surgia como um contraponto ao Fórum Econômico Mundial, realizado anualmente em Davos (Suíça). As três primeiras edições do FSM, além da de 2005, aconteceram em Porto Alegre, que por conta disso ficou conhecida como “Davos quente” (e põe quente nisso!), em oposição à neve da cidade suíça.
Mas a escolha de Porto Alegre para sediar as primeiras edições do Fórum Social Mundial não se deveu ao calor. A cidade o fez por merecer, por conta de suas experiências democráticas reconhecidas internacionalmente, como o Orçamento Participativo, em que a população pode opinar sobre o destino dos recursos públicos – que assim podem ser direcionados para as áreas que mais necessitam deles, a partir do que reivindicam os próprios cidadãos. Implantado em 1989 pelo governo de Olívio Dutra, o OP tornou-se quase que uma instituição na cidade. Tanto que em 2004, José Fogaça (então PPS, agora PMDB) prometeu mantê-lo em sua vitoriosa campanha à prefeitura.
O Fórum Social Mundial serviu para dar ainda mais visibilidade a Porto Alegre. A cidade transformou-se em um símbolo de resistência ao neoliberalismo e, por isso mesmo, de esperança, de que “um outro mundo é possível”. E o FSM foi bom até mesmo em termos capitalistas para Porto Alegre, pois movimentou a economia da cidade (hoteis, restaurantes etc.) em uma época tradicionalmente “parada” que são os meses de janeiro e fevereiro.
Porém, o que se viu desde que Fogaça assumiu a prefeitura em janeiro de 2005 foi um progressivo sucateamento dos serviços públicos em Porto Alegre. O próprio Orçamento Participativo foi esvaziado, tornou-se um arremedo do que era antes. E mesmo com a visível piora da cidade no período de 2005 a 2008, Fogaça foi reeleito.
O Fórum Social Mundial acabou indo embora – retornando apenas para uma das etapas da edição descentralizada de 2010, mas sem o mesmo entusiasmo de antes. Afinal, Porto Alegre deixou de ter um clima propício para tal evento, com um governo oposto aos ideais de um outro mundo possível – aliás, o que não difere da maioria dos porto-alegrenses, que o elegeu.
E agora só se fala em como Porto Alegre “não é atrativa”, que tem de aproveitar a Copa de 2014 para “se modernizar”, para que possa ser “uma cidade conhecida”. Porra, como assim? Pois a cidade já era conhecida… Se o deixou de ser, foi como eu disse: por opção.
Ou seja, se decidiu por deixar de ser uma referência mundial de democracia*, e agora se quer ser uma “cidade global”, conceito puramente econômico. E para isso vale tudo, até mesmo jogar fora a própria identidade: há quem ache que Porto Alegre precisa “virar uma Dubai” – que é também uma cidade que abriu mão de suas características, onde o árabe (lembrando que Dubai faz parte dos Emirados Árabes Unidos) quase nem é mais falado, sendo substituído pelo inglês, “língua dos negócios”.
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* Falar em Porto Alegre no exterior ainda significa referir-se à cidade do Fórum Social Mundial e do Orçamento Participativo, mesmo que o FSM tenha ido embora e o OP seja uma caricatura do que já foi.
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Caramba, eu tenho um tio professor de Direito que tava falando maravilhas de Porto Alegre, dizendo que era uma cidade fantástica, principalmente academicamente falando. Até lembrei de ti, Rodrigo. É uma pena que se percam essas iniciativas. Aqui em Fortaleza, a atual gestão, do PT, implantou o OP, mas não com o vigor necessário. Sem contar que – apesar de algumas iniciativas interessantes, temos que reconhecer – é provável que o legado da nossa (não muito) querida Luizianne seja que não se vote nas esquerdas locais por um bom tempo…
Oi, Cão, meu post sobre a nova publicidade golpista da Globo News http://asarvoressaofaceisdeachar.blogspot.com/2011/01/nao-pense-na-cbn-muito-menos-na-globo.html
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